Reunião pública teve falas de advogadas, mulheres em situação de violência e profissionais da rede de proteção.
Em reunião pública na noite desta quinta-feira (1º), a Procuradoria da Mulher (ProMulher) da Câmara Municipal de Curitiba (CMC) promoveu um debate sobre os fluxos de atendimento à violência sexual contra a mulher na rede de serviços públicos da capital. “Existem fragilidades no atendimento da rede e é por isso que a gente está discutindo, para que se busquem soluções”, ponderou a procuradora da Mulher na Casa, vereadora Maria Leticia (PV).
A proposta do debate, explicou Maria Leticia, surgiu após ela ouvir uma mulher que foi estuprada e relatou uma experiência negativa de atendimento ao denunciar o crime. A estrutura de acolhimento à mulher em Curitiba, comentou a parlamentar, é “super exemplar”, principalmente se comparada a cidades do interior do Paraná. Por isso, avaliou, é necessário corrigir esses fluxos.
Durante o debate, mulheres que sofreram violência sexual e doméstica, além de advogadas que já acompanharam clientes nesses casos, apresentaram relatos sobre o atendimento ao buscar serviços da capital, como a Casa da Mulher Brasileira e o Hospital de Clínicas. “A minha questão é o tratamento humanizado, o fluxo e o tempo [de espera]”, citou uma advogada.
“Temos o pessoal na delegacia passando por capacitação mensal para atendimento às vítimas”, argumentou a delegada Vanessa Alice, titular da Delegacia da Mulher. Sobre o tempo de espera, ela afirmou que as segundas-feiras são bastante movimentadas. “Ininterruptamente a delegacia da mulher presta atendimento, e com delegado. As delegadas estão 24 horas de plantão.”
Conforme a coordenadora-geral da Casa da Mulher Brasileira, Sandra Praddo, no local são atendidas diariamente de 40 a 50 mulheres. “Hoje são só sete Casas da Mulher Brasileira em todo o Brasil. Curitiba tem o privilégio de ser uma dessas casas”, defendeu. “Podemos falar dos gargalos, mas isso são exceções, não são via de regra”, ponderou.
(Foto: Rodrigo Fonseca/CMC)
Coordenadora do Núcleo de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher (Nudem), Mariana Martins Nunes também falou do alto fluxo de atendimentos na Casa da Mulher Brasileira. “O atendimento à mulher em situação de violência é muito específico”, pontuou. “A gente sente que não existe essa rede entre Judiciário, Ministério Público e delegacia”, avaliou a assessora jurídica Maria Leticia Cruz, do Ministério Público do Paraná (MP-PR). “Essa vítima que sobreviveu é uma potencial vítima do mesmo autor”, acrescentou.
“Algo de prático, minha sugestão seria criar uma cartilha com telefones, algumas informações, que no final do atendimento seja entregue à vítima”, propôs a juíza Luciane do Rocio Custódio Ludovico, que integra a Coordenadoria Estadual da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar (Cevid) do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR). A ideia, explicou, é que a pessoa possa saber os trâmites do processo e quais órgãos públicos deve acionar para buscar mais informações.
Camila de Oliveira, que assessora a ProMulher, acredita que a cartilha seria positiva, mesmo que poucas mulheres “se sintam acolhidas e não sejam revitimizadas”. Coordenador de Relações Institucionais do Pequeno Príncipe, Rodrigo Bonfin deixou como referência alguns materiais criados pelo hospital, voltados a profissionais da saúde e da educação, além de livros de poesia para empoderar as crianças e os adolescentes.
Carmen Regina Ribeiro, da Rede Feminista de Saúde, chamou a atenção, em especial, sobre a desinformação ao aborto legal, inclusive no caso de crianças e adolescentes estupradas. “Está na lei, gente, mas a gente morre de medo de falar em aborto. […] Uma coisa que a gente precisa batalhar muito é informar”, argumentou. “Tem que ter um cartaz na porta de cada unidade de saúde, de cada escola, do que tem que fazer [em caso de violência sexual].” Para Vanessa Amarante, do Instituto Alice Quintilhano, é essencial que haja a capacitação dos profissionais da saúde, em especial nas unidades básicas de saúde, para que estejam atentos aos sinais de violência.
A assessora de Direitos Humanos e Políticas para as Mulheres da Prefeitura de Curitiba, Elenice Malzoni, pontuou que cartilhas e fluxos já existem, e não apenas para o atendimento inicial. “Como é que essa informação não está chegando?”, pontuou. “Em momento algum ela pode se sentir perdida. O que está faltando é divulgar esses serviços.” O Executivo, segundo Malzoni, planeja lançar um portal voltado aos direitos da mulher e aos protocolos da denúncia, por exemplo, em caso de estupro. Outras entidades e órgãos públicos, além de cidadãos interessados no debate do tema, também participaram da reunião pública.
(Foto: Rodrigo Fonseca/CMC)
A ProMulher
Combater todas as formas de violência e discriminação contra as mulheres. Esse é o objetivo da Procuradoria da Mulher da CMC. Criado em 2019, após a inclusão no Regimento Interno, o órgão foi inserido no organograma da Casa quase dois anos depois, em 2021, com a aprovação da lei municipal 15.880/2021. No biênio 2021/2022, Maria Leticia ocupa o cargo de procuradora; e Noemia Rocha (MDB) e Carol Dartora (PT), o de primeira e segunda-procuradora-adjunta, respectivamente. A ProMulher é independente. Isto é, não é subordinada a nenhum órgão da Casa. As principais funções são: receber, examinar e encaminhar aos órgãos competentes denúncias de violência e discriminação contra a mulher; fiscalizar as políticas públicas e os programas municipais para a igualdade de gênero; zelar pela participação efetiva das vereadoras nos órgãos e nas atividades da Câmara Municipal; promover campanhas educativas e antidiscriminatórias; cooperar com organismos locais, estaduais e nacionais, públicos ou privados; e realizar pesquisas, seminários e demais atividades ligadas ao tema e à representação feminina na política.