Crédito: Bem Paraná
Em 2022, o Paraná registrou um aumento de 30% nos casos de feminicídio consumados ou tentados em relação ao ano anterior, com 274 ocorrências, contra 212 de 2021. Apesar desses números crescentes, a vereadora de Curitiba, Maria Letícia (PV), que é médica-legista e procuradora da Mulher na Câmara Municipal, considera que esse tipo de crime ainda é subnotificado por dificuldades técnicas de investigação e falta de protocolos adequados das instituições responsáveis por atender essas ocorrências.
Em entrevista ao Bem Paraná, a parlamentar fala sobre esses e outros assuntos, e explica também porque considera que a oposição deve ter um candidato competitivo à prefeitura de Curitiba em 2024, para não repetir os erros de 2020, quando o prefeito Rafael Greca (PSD) foi eleito no primeiro turno.
Bem Paraná – Temos vistos avanços no Brasil no combate a violência contra a mulher no país inclusive com a criação de procuradorias da Mulher em legislativos municipais e estaduais, como o que a senhora comanda na Câmara. Mas ao mesmo tempo o número de feminicídios têm crescido. O que a senhora acha que falta para avançar mais no combate a esse tipo de crime?
Maria Letícia – Primeiro, eu tenho um olhar de médica-legista na em relação a identificação desses crimes e principalmente o feminicídio. A do feminicídio é muito difícil porque não basta um exame de necropsia pra identificar. É preciso outros elementos que envolvem o crime, que são por exemplo o próprio cenário onde aconteceu. Isso é muito complexo. Então, por isso que eu acho que há uma subnotificação em se tratando de feminicídio. Há uma subnotificação certamente deste crime em específico porque ainda não se tem um protocolo claro sendo seguido pelos pelas entidades que respondem pela identificação. Quem diz que é feminicídio é o Judiciário, mas é importante que a perícia dele dê elementos para que o Judiciário possa definir como feminicídio . Então não é só uma necropsia, é a cena do crime, a arma utilizada, ela vai ajudar em quantos tipos de armas foram utilizadas por exemplo, eu posso identificar faca, objetos de arma de fogo no mesmo corpo. Identificar sinais de perversidade, coisas assim. Mas é um conjunto de coisas. Então o feminicídio é muito específico.
BP – E em relação ao combate à violência contra a mulher de uma forma geral?
Maria Letícia – Acho que tem muito a ser feito, na verdade isso só vai avançar a medida que a mulher também estiver ocupando espaços políticos e espaços de liderança. Porque é preciso que a mulher participe dos debates que dizem respeito às suas pautas. No meu entendimento é isso, é preciso que a mulher esteja mais presente cenário político, no cenário empresarial, em todos os aspectos pra que ela possa participar de um debate. Enquanto isso não acontecer, a violência contra ela vai quase que se perpetuando.
BP – A Câmara de Curitiba tem hoje oito vereadores, maior número da história, mas ainda muito abaixo da representatividade das mulheres. No debate interno, como a senhora vê o espaço das vereadoras?
Maria Letícia – Hoje é muito difícil. Tem uma coisa que chama violência política que a gente sofre diuturnamente na Câmara Municipal. Por exemplo, frequentemente somos interrompidas por nós estamos ali no nosso direito fala e eles começam a se manifestar para nos interromper. Entre outras coisas. Por exemplo, a tramitação dos nossos projetos, eles às vezes têm muita resistência de aprovação nas comissões temáticas, principalmente de mulheres que são mais progressistas. Que que trazem temas para o debate que podem ser considerados mais polêmicos.
SUCESSÃO MUNICIPAL ‘Oposição não pode repetir em 2024, os erros de 2022 na eleição de Curitiba’ Bem Paraná – A senhora está no PV, que hoje participa de uma federação com o PT e o PSB. Portanto, vocês vão ter que definir um candidato único para a prefeitura nas eleições de 2024. Pelo lado da situação, fala-se na candidatura do atual vice-prefeito, Eduardo Pimentel (PSD) com o apoio do governador. Quais as perspectivas da oposição nessa disputa? Maria Letícia – Eu tenho conversado com presidente do municipal (da federação), Ângelo Vanhoni (PT). Não há nada definido. Nem nome. Claro que sempre aparece uns nomes . Mas já se fala nisso. Vai ter candidato muito provavelmente. Um candidato a prefeito também ajuda muito na bancada o que vai ser eleita. Então certamente a federação vai ter um candidato, mas eu não sei o que dizer os nomes que estão sendo ainda pré-colocados.
BP – Nas eleições de 2020, o prefeito Rafael Greca (PSD) foi reeleito no primeiro turno com facilidade. Houve uma desarticulação da oposição? Maria Letícia – Concordo. BP – A senhora acha que isso deve mudar? Maria Letícia – Eu acho que não deve acontecer de novo. O Greca se reelegeu sem ir a nenhum debate e no primeiro turno, então mostra claramente essa desorganização da oposição. Ele não teve adversários porque demoraram para indicar e foi aquela confusão. Agora eu não vejo mais isso. Já vejo alguns nomes que estão mais ou menos desenhando aqui para gente. Então, o (Eduardo) Pimentel que é o candidato que surge da prefeitura e do próprio governador. O (Ney) Leprevost deve também colocar o nome. A federação deve lançar um bom nome, certamente porque, pela própria força do Governo Federal. Porque o Governo Federal agora é oposição, então a gente deve ter aí um enfrentamento mais equilibrado. Eu não acho que quem ganhar, vai ganhar com facilidade, eu até aposto no segundo turno, seja lá o nome que for.
FUNCIONALISMO ‘Servidores municipais devem ser ouvidos sobre novo plano de carreira’ Bem Paraná – A Câmara deve retomar a discussão do plano de carreira dos servidores, que foi adiado. quais as principais preocupações que a senhora havia nesse nesse debate? Maria Letícia – Os servidores, desde 2017, vivem uma situação bem complicada. O congelamento das suas carreiras. E por conta disso, o congelamento de salários e de migração dentro das suas carreiras. Minha preocupação é que esse projeto veio para a Câmara sem debate com o servidor, com o sindicato. Então, o projeto foi retirado temporariamente e já existe um uma agenda com o secretário Jabur que é da Secretaria Geral do Município. Deve haver uma outra reunião agora e a gente vai começar a debater esse tema tão logo ele possa vir para a Câmara.
BP – Outra questão que deve ser debatida nos próximos dois anos é a licitação do transporte coletivo. A licitação anterior teve uma série de problemas, inclusive denúncias de de manipulação. O sistema tem perdido passageiros. O que a Câmara pode fazer para que esses problemas se repitam?
Maria Letícia – A Câmara tem um papel central nessa discussão. O transporte coletivo acabou recebendo pelo menos três subsídios do município a justificativa da pandemia, que caiu o número do usuários. Só que não existe qualidade. Ousuário enfrenta um ônibus geralmente em condições precárias. Existe até um uma discussão em relação ao quantos anos esses ônibus devem ter para circular e quanto deve ser retirado porque às vezes a condição é tão precária que há muito desconforto, eles andam apertados dentro daquele ônibus e a tarifa é uma das mais altas. Então é preciso que a gente reveja isso e discuta realmente porque as empresas são as mesmas, estranhamente. Tem sempre a mesma empresa ganhando a licitação. Então todo mundo sabe quem é. É uma coisa assim quase descarada. Nós já estamos nos organizando na oposição, debatendo e vemos pontos nos quais a gente deve fixar e exigir e cobrar coisas do município.